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Recuerdo

Recuerdo
(Edilberto Bérgamo, Guilherme Collares)

Recuerdo sabe do tempo do meu sombrero ladeado
E do trotesito largo procurando teu amor
Recuerdo sabe do tempo do meu ponchito listrado
Voando na polvadeira de um corredor

Recuerdo adoça esta vida que amarga se fez ausência
De um passado que é distância gemendo em guitarra a dor
Recuerdo me traz de volta todo sabor da querência
Perdido na polvadeira de um corredor

Recuerdo guarda a saudade de um tempo que hoje é ausência
E troteia na distância de uma vida que passou
Recuerdo procura a volta pra quem perdeu a querência
Na curva de algum caminho e não voltou

Recuerdo sabe do tempo de um rodeio bem parado
Onde o respeito trançado volteava os refugador
Recuerdo sabe de um tempo das cruz de um baio encerado
Num trotesito ladeado pra minha flor

Recuerdo adoce esta vida que amarga se fez ausência
De um passado que é distância gemendo em guitarrador
Recuerdo me traz de volta todo sabor da querência
Perdido na polvadeira de um corredor

Recuerdo guarda a saudade de um tempo que hoje é ausência
E troteia na distância de uma vida que passou
Recuerdo procura a volta pra quem perdeu a querência
Na curva de algum caminho e não voltou


De Estrela A Estrela

De Estrela A Estrela
(Edilberto Teixeira, César Oliveira)

Quando a boieira linda aponta
De manhã no alto da telha
Pai-de-fogo acende a ponta
Com as faíscas dessa estrela

Seu clarão acorda os galos
Chia o bico da chaleira
Une os bois, toca os cavalos
Bota as vacas na mangueira

Na garupa traz a aurora
E as cantigas pra o terreiro
Lá no cerro imita a espora
No garrão do peão campeiro

Sempre a boieira traz o dia
Meia légua antes do sol
E à tardinha é a estrela guia
Que anuncia o arrebol

Relógio do campo
Ela acorda o peão
E o galo abre o canto
Ao enxergar seu clarão

Relógio do campo
Alumia o galpão
E lá no imenso vazio
Ela acende o pavio
Pra dizer que horas são

Quando o sol ébrio de sombras
Lá se vai manco do encontro
Dita Vênus, sai das lombas
Ver se o mate já está pronto

Mesma estrela vespertina
Vai com os bois beber na sanga
Lambe o sal dentro da tina
E vem dormir junto da canga

Com esta boieira viajada
O João-do-Campo se assemelha
Porque sempre a sua jornada
Vai de uma estrela a outra estrela

Madrugada e arrebol
Marcam assim a lida campeira
Muito mais que sol a sol
Vai da boieira a outra boieira


Peñarol

Peñarol
(Luiz Carlos Borges, Mauro Ferreira)

Quem é de Lavras se lembra do meu galgo Peñarol
Baio, brasino, bragado, olhos gateados de sol
Quando meu galgo arrancava com o lombo que era um anzol
Bicho que fizesse rastro saía do campo vasto
Pra os dente do Peñarol.

Me regalou Gim Pinheiro de lá de Tacuarembó
Era um filhote franzino, magrinho que dava dó
Quem ia dizer que aquilo fosse empurrar mocotó
Ganhar dezoito carreiras e os galgos desta fronteira
Entupiu os olhos de pó.

Lebrinha de pêlo fino, sorrito do pêlo grosso,
Depois de ele botar o olho não tinha muito retoco.
Cruzava dos outros galgos que nem dos cachorros "grosso",
Quadrava o corpo pra o lado, cortava de atravessado
E grudava atrás do pescoço.

Um dia o Cássio Bonotto, proseando e tomando um trago,
Me contou de um sorro baio que havia lá por Santiago,
Corria mais que os cachorros, vivia fazendo estrago,
De tanto comer cordeiro, já nem botavam carneiro
Nas ovelhas deste pago.

Eu disse pra este amigo: mês que vem vou na tua casa,
Me espera com uma de vinho e um chibo em cima da brasa.
O Peñarol vai na piola porque ele não perde vaza,
Te garanto que o tal sorro pra escapar do meu cachorro,
Só que entoque ou crie asa.

Cheguei no dia marcado, tinha gente até de farda,
Nunca vi tanto gaúcho, nunca vi tanta espingarda.
Diziam: o sorro é bruxo cruzado com onça parda.
Eu disse: deixem comigo! Quem tem medo do perigo
Que espere na retaguarda.

Quando batemos no rastro vi que o bicho era escolado,
Fez que ia pra coxilha e respingou rumo ao banhado,
Meteu o dente num galgo, depois cruzou no costado,
Com a cuscada na escolta, gambeteava e dava volta,
Parecia enfeitiçado.

Eu dei cancha pro meu galgo, que saiu erguendo pó,
Porque no fim do banhado era um capão de timbó.
Tinha que alcançar o maleva antes desse cafundó,
E eu também larguei com tudo, num lobuno topetudo
Que era marca da Itaó.

De fato o sorro corria como pouco sorro faz,
Mas peão só se governa onde não tem capataz.
Em seguida, meu cachorro fez ele virar pra trás,
E desceram sanga abaixo, "cosa" de macho com macho,
Trançando dente no más.

Foi quando eu ouvi um tiro vindo de lá do sangão,
Estouro de arma de chumbo de um louco sem precaução,
Apeei por cima do toso pra dar fé da situação,
Meu galgo tava sangrando, mas continuava peleando,
Baleado no coração.

Agarrou o sorro "das goélas" e apertou contra o capim,
Pra dar fim naquela lida, antes da vida ter fim.
Depois "periga" a verdade, mas juro que foi assim,
Deitou por cima do sorro, gruniu pedindo socorro
E morreu olhando pra mim.

Enterrei ele no campo florido de “Maria Mol”,
Se foi meu galgo bragado do lombo que era um anzol.
Lembro dele com tristeza quando sangra o pôr-do-sol.
O causo vem pra memória e a saudade conta a história
Do meu galgo Peñarol!




Peñarol - César Oliveira E Rogério Melo by Guascaletras

Da Alma de Dom Emílio


Da Alma de Dom Emílio
(Rogério Villagrán, César Oliveira)

"Foi bem assim desde cedo e a filosofia é essa
Que bem mais taura é quem empeza o dia com pé esquerdo
E entre manhas e segredos o meu instinto vagueia
Minha alma troca orelha meu coração escramuça
Até parece que pulsa sangue crioulo em minhas veias"

Vem das bibocas da historia a causa que me aprofundo
Quando o mundo se fez mundo na ânsia demarcatória
Que perpetuou na memória deste meu povo caudilho
Coisas que de pai pra filho botam na forma o consolo
E que o rasto de um crioulo é a alma de Dom Emílio

Assim no temblor das patas bagualas pátrias nasceram
E macharronas cresceram sendo aos crioulos "muy" gratas
Este é um nó que não desata por que em cada um se arrancha
A força que pede cancha unindo no mesmo açoite
Sul e norte, dia e noite lua e sol, "gato e mancha"

E agora frente ao futuro sinto a mesma ansiedade
E não escondo a vaidade quando encilho o pelo duro
Num aparte não me apuro por que ele sabe o volteio
Pois se o boi me faz floreio um "buen criollo" dá o troco
Se arranca e por muito pouco não me tira dos arreios

Crioulo pingo campeiro que enche os olhos da gente
Na paletada é um valente sendo sereno e certeiro
Do ginete é um companheiro um do outro testemunho
Agarrados punho a punho são payador e guitarra
Um ajoja o outro esbarra e sobre patas um só redemoinho

Foram zainos e rosilhos, virão picaços e mouros
Em busca do mesmo ouro reluzindo o mesmo brilho
Marcando bem mais o trilho onde a beleza é a função
Nos mostram que a evolução é a força que nos garante
Que o crioulo siga a diante sem perder a tradição

Chasque Pra Dom Munhoz


Chasque Pra Dom Munhoz
(Gaspar Machado, Airton Pimentel)

Amigo Élbio Munhoz meu chasque não tem floreio
Eu uso bombacha larga e um chapéu de um metro e meio
Botas de garrão de potro laço, pealo e gineteio
E me sustento pachola na serventia do arreio

Por voltas que a vida faz para açoitar um cristão
Ando cortado dos trocos freio e pelego na mão
Sem um cavalo de lei pra visitar meu rincão
O nosso caiboaté é grande e guardo no coração

A tia Maria me disse que tua tropilha é de lei
E o José Rodrigues ramos confirmou quando eu pensei
Em te pedir um cavalo nesses versos que eu criei
Pra cantar em São Gabriel querência que eu sempre amei

Entrega pro tio Adil lá na costa do lajeado
E diz pra Anilde e a Silvinha que eu chegarei afogado
Num borrachão de saudade do tamanho do meu pago
E a negra Juci que espere com chimarrão bem cevado

Dom Élbio guarde consigo que um dia arranco do peito
E pago esta obrigação que me deixa satisfeito
E o pelo é da tua conta baio ou rosilho eu aceito
Que o velho Moacir Cabral me fez assim por direito

Bastos Potros e Guitarras


Bastos Potros e Guitarras
(Rogério Villagrán, César Oliveira)

Bastos, potros e guitarras
Guitarras, potros e bastos
Cantigas cheirando a pastos
Milongas, polcas, chamarras

Um maula berrando forte
Um recal ringindo os tentos
Contra-punteando com os ventos
Que se levantam do norte

Se eu pudesse cantar versos
Como sou esporeador
Conquistava a china Rita
Cantando versos de amor

De um potro faço a guitarra
Da guitarra faço um potro
E antes que a noite me alcance
Largo um e encilho o outro

Quem me dera ter na alma
O corpo de um Martin Fierro
E as batidas de um cincerro
Me atormentando a calma

Quem me dera ter nos dedos
O que sobra nas esporas
Pra guitarrear nas nas auroras
E revelar mil segredos

Porém me sobra o que tenho
Pois tenho pouco floreio
Meu canto é mescla das ânsias
Dos que vivem dos arreios

Sovéus, maneias e riendas
Fazem parte dessa farra
Porque a vida entreverou
Bastos, potros e guitarras

Regional


Regional
(Anomar Danúbio Vieira, Rogério Melo)

Regional é uma criolla; arte, cultura campeira
Um rangido de basteira, um redomão de bocal
Um universo rural num sentimento profundo
Que antes de sermos do mundo, temos que ser regional

Meu canto crioulo é qual pasto nativo
Que brota com força e se estende na pampa
Juntou rebeldias pelas recolutas
Da raça mais bruta herdou essa estampa

É grito tropeiro, é mugido de tropa
E assim se alvorota pedindo bolada
Cincerro de bronze chamando a tropilha
Clarim farroupilha anunciando alvorada

Curtido a Minuano e a pó de mangueira
A berro de touro e relincho de potro
Moldei este canto pra hino campeiro
Por ser verdadeiro é sinuelo pra os outros

Se quedou então Regional
Pela tradição que traduz o seu jeito
Tendo sentimento de pátria no sangue
E amor ao Rio Grande batendo no peito

Regional por devoção, regional de nascimento
Regional no pensamento, na conduta e na emoção
Lá num oco do rincão trancando o pé na macega
Que um regional não se entrega tendo ou não tendo razão

Mistura de verso e resmungo de gaita
Conceito de povo templado na guerra
Que fez seu destino arrastando choronas
Gravando o idioma no lombo da terra

Carrega nas cinzas de cada memória
A alma e a história do pago ancestral
Forjadas num lenço, parte de bandeira
Brasão de fronteira, padrão Regional

Curtido a Minuano e a pó de mangueira
A berro de touro e relincho de potro
Moldei este canto pra hino campeiro
Por ser verdadeiro é sinuelo pra os outros

Se quedou então Regional
Pela tradição que traduz o seu jeito
Tendo sentimento de pátria no sangue
E amor ao Rio Grande batendo no peito

Meu canto crioulo é qual pasto nativo…

Baile Gaúcho


Baile Gaúcho
(Anomar Danúbio Vieira, Juliano Gomes)

Uma morena de cruzá em arroio fundo
Cosa mais linda do mundo, era o destaque da sala
De vez em quando se luzia e gavionava
E há tempos eu cobiçava pra debaixo do meu pala

Passou bailando e me largou um par de vistaço
Preparei um cavallaço sacando o folha de abóbra
Todo o fronteiro no entrevero se agigantava
Depois de um samba com fanta… tenho coragem de sobra!

Baile gaúcho, cordeona e china bonita!
Não se acredita no poder dessa infusão.
Livra os pecados, cura as malezas da vida
E cicatriza as feridas que afligem o coração

E assim levei a conversa, lembrando que a noite é pouca
Que sorte louca, me dá o prazer desta marca
Porque depois de nós se enredar num bailado
Nem raio, nem delegado, nem o teu pai nos aparta

E esta morena saiu manhosa se espiando
De soslaio me bombeando, ariscona prás conversa
Assim que eu gosto, quanto mais xucra, mais doce
- Qual o santo que te trouxe?
Que eu vou pagá uma promessa!

E se o gaiteiro for das bandas de Santana
De alma véia castelhana, vaqueano das madrugadas
Sabe que a volta pra um romance de primeira
É num tranco de fronteira, pra bailar de cola atada.

Apegos E Anseios Do Meu Canto

Apegos E Anseios Do Meu Canto
(Rogério Villagrán)

Rezo esta prece frente ao altar que me atrai
Aquerenciado nesta crença que levanto
Junto ao apego que sustenta minha gana
De ser terrunho, crioulo do chão que canto
Junto ao apego que sustenta minha gana
De ser terrunho, crioulo do chão que canto

Trago comigo tropilhas de pingos buenos
Rodeios grandes costeados nos paradouros
Gritos de venha que requintavam lonjuras
Em meio à poeira baguala dos corredores
Gritos de venha que requintavam lonjuras
Em meio à poeira baguala dos corredores

Levo por diante repontando pela força
Desta cantiga que alimenta um sonho pampa
O anseio pátrio que eu herdei dos que pelearam
Pra que hoje em dia seja um marco à nossa estampa
O anseio pátrio que eu herdei dos que pelearam
Pra que hoje em dia seja um marco à nossa estampa

Erguerei ranchos na imensidão do meu mundo
Deixarei rastros de tanto cruzar distâncias
Pra que a existência do meu canto se eternize
Com o mesmo entono de um grito de um peão de estância
Pra que a existência do meu canto se eternize
Com o mesmo entono de um grito de um peão de estância

Que ainda ecoa em algum fundo de campo
Alto e liberto num repique fascinante
Ganhando espaço a cada romper de aurora
Que o sol destapa levando o resto por diante
Ganhando espaço a cada romper de aurora
Que o sol destapa levando o resto por diante

Assim meu canto será mais que o meu destino
E algo disso deixarei pelos caminhos
Pra que algum dia eu escute em alguma boca
Coisas que eu sei que nunca cantei sozinho
Pra que algum dia eu escute em alguma boca
Coisas que eu sei que nunca cantei sozinho

Coisas que eu sei que eu nunca cantei sozinho…

Sob As Mangas Do Aguaceiro

Sob As Mangas Do Aguaceiro
(André Oliveira, Rogério Melo)

A manga calma se transforma em aguaceiro,
O chuvisqueiro desentoca um campomar
Que se tolda em cima dum baio-oveiro,
Com meu sombreiro que tombeia ao desaguar.
Fecho seis dias que eu lido no alagado
E o banhado já virou um tremendal
Onde é várzea se tornou tudo encharcado
Campo dobrado vertente de lamaçal

Até a baeta do meu poncho está molhada,
Garra ensopada de varar passo e sanga
O galpão virou um varal de arreios
Oreando aperos enxaguados pela manga
O gado berra nostalgeando tempo feio
E a parelha do arreio calechou-se das basteiras
Lombo molhado pra pisar foi bem ligeiro.
Ainda a força do potreiro ta de baixo da aguaceira

Uma estiada negaceia por matreira
Com cisma de caborteira vem escondendo a cara
Do meu galpão sorvo as horas tramando tentos
Desquinando pensamentos, remendando alguma garra.

Então me olvido empreitando esta faina
Pois a força divina já mais falha e nunca erra
Talvez a chuva seja o adubo já gasto
Que veio firma o pasto e larga uma graxa na terra

Alma de Fronteira

Alma de Fronteira
(Rogério Villagrán, Enio Medeiros)

Chapéu tapeado pra enxergar de ponta a ponta
Lenço vermelho, bandeira de um maragato
Estampa guapa, tronqueira do nosso Estado
Enforquilhado num baio ovo-de-pato

Espora buena, buzinuda, tilintando
Marca o compasso do meu pingo troteador
Jeito atrevido de quem vem pedir bolada
Alma tisnada da poeira do corredor

Trago em reponte batidas de algum cincerro
Gritos de forma, por isso sou da fronteira
Meu berço xucro, sagrado torrão sulino
Onde o teatino cheira a terra de mangueira

Me criei taura, laçando e boleando potro
E abrindo a perna de alguma bolcada feia
Quando preciso, abro o peito companheiro
Por que um fronteiro não se enreda nas maneias

O meu cantar fala de doma e campereada
A minha voz é xucra igual berro de touro
E as minhas penas são queimaduras de laço
Que num guascaço nos deixam marcas no couro

Trago em reponte batidas de algum cincerro
Gritos de forma, por isso sou da fronteira
Meu berço xucro, sagrado torrão sulino
Onde o teatino cheira a terra de mangueira

À Uma Tropilha Veiaca

À Uma Tropilha Veiaca
(Rogério Villagrán, César Oliveira)

Inté parece que o chão vem se abrindo aos poucos
Quando esses loucos se entropilham na invernada
E vem roncando marcando a casco este pampa
Mostrando estampa, topete e cola aparada.

Zainos, tordilhos, gateados, baios e mouros
Pingos de estouro que se aporrearam por malos
Negando o estribo ao índio que joga sorte
De encontro à morte no lombo desses cavalos.

É das baguala esta tropilha que eu canto
E lhes garanto não hay eguada mais dura
Um querosena da marca de Dom Reinaldo
Deixa arrepiada a mais taura das criaturas.

Quem tem coragem, força na perna e destreza
Sente firmeza quando um sotreta se atora
Porque um veiaco da tropilha da floresta
Enruga a testa do guasca que calça espora.

Esta tropilha é conhecida por veiaca
Pra maritacas e rebenques não se entrega
De ponta a ponta cruza o meu pago sagrado
Com lombo arcado dando coice nas macegas.

Eguedo quebra se entona soprando as ventas
Porque sustenta mil marcas entreveradas
Pois o destino d’um flete que não se amansa
Deixa lembranças numa tropilha aporreada.

Pingos de fama pato preto e chacarera
Moura cruzeira, rebordosa e temporal
São entre outros malevas que escondem o rastro
Em pêlo e basto seja argentino ou oriental.

Por isso aonde o cincerro bater mais forte
E o vento norte assoviar junto das frestas
Andarão soltos na fumaça do entrevero
Os caborteiros da tropilha da floresta.

Prá Bailar De Cola Atada

Prá Bailar De Cola Atada
(Anomar Danúbio Vieira, Juliano Gomes)

De vereda me acomodo, se d’um baile sinto cheiro
Sacudo o pó da mangueira, lá no açude do potreiro
Encharco de amor gaúcho a estampa de um peão campeiro
Por que sei que na minha terra dá pra confiar nos gaiteiros.

Pra bailar de cola atada campeio a volta do mouro
E um par de esporas prateadas, saio beliscando o couro
Levo na alma a esperança de hoje enfrena um namoro
E um três oitão das confiança, pra causo algum desaforo.

Vou tirá china mais linda pra bailar de cola atada
E se não souber dançar ensino e não cobro nada
Depois que meto o cavalo seja lá o que Deus quiser
Pois sou do tempo que os home ainda gostavam de mulher.

A cordeona dá um gemido a polvoadeira levanta
E eu já de pala encardido arrasto o pé na bailanta
Vou cochichando no ouvido meu segredo pra percanta
E bem campante convido pra tomá um samba com fanta

Se debrucemo na copa e ali troquemo uns carinhos
Com juras de amor eterno, ninguém quer morrer sozinho
Não me tenteia morena que tu é flor cheia de espinho
E eu tô loco de vontade de te arrastar pra o meu ninho.

Vou tirá china mais linda pra bailar de cola atada
E se não souber dançar ensino e não cobro nada
Depois que meto o cavalo seja lá o que Deus quiser
Pois sou do tempo que os home ainda gostavam de mulher.

Imagens

Imagens
(Anomar Danúbio Vieira, Marcello Caminha)

Não crio imagens bombeando o vão das cancelas
Da moldura das janelas sob a quincha dos galpões
Mas bem montado sobre o lombo do cavalo
Botando pealo em rodeio e marcações

Não crio imagens nos mates ao pé do fogo
Envolvido pelo jogo de alguma angústia encruada
Mas sim num grito pra tirar o gado da grota
Ou na culatra da tropa que se perfila na estrada

Não crio imagens de campanha entristecida
Pela vida enrijecida no compasso da existência
Mas da alegria e da emoção das carreiradas
Nos bolichos beira-estrada pelos fundões da querência

Não crio imagens na clausura das paredes
Embora as mesma guardem lembranças dos meus
Mas sim liberto num santo altar de coxilha
Porque ali estou mais perto de mim, do vento e de Deus

Não crio imagens que acalantem muitas almas
Me falta calma pra saudade e solidão
Se isso for imposição, talvez nem seja poeta
Mas a palavra direta me salta do coração

Não crio imagens dos momentos que não gosto
Pois não aposto em parelheiro perdedor
Se a mim me agrada as lidas de campo a fora
Crio imagens das esporas no garrão de um domador

Não crio imagens de trastes dependurados
Nem de termos delicados, mas que tem pouco valor
E sim de laços, de bocal basto sovado
De cachorros ensinados que são gente num fiador

Não crio imagens prá chorar águas passadas
Pois enxergo meu futuro muito além dos horizontes
Eu crio imagens pra que se forjem pampeanas
Pois no sangue tenho ganas de distâncias e repontes

Não crio imagens na clausura das paredes
Embora as mesma guardem lembranças dos meus
Mas sim liberto num santo altar de coxilha
Porque ali estou mais perto de mim, do vento e de Deus

Não crio imagens que acalantem muitas almas
Me falta calma pra saudade e solidão
Se isso for imposição, talvez nem seja poeta
Mas a palavra direta me salta do coração

A Cusco E Mangaço

 A Cusco E Mangaço
(Mauro Moraes, Anomar Danúbio Vieira)

Quando esparramo meu laço
Calçando o zaino na espora
Num combate campo a fora
Contra um boi mandando pata
Quis a mala suerte ingrata
Que eu errasse aquele pealo
E que rodasse o cavalo
Virge! quase que me mata

Mas como eu sou vaqueano
Cruzei a perna ligeiro
Só escutei o entrevero
De pingo, terra e boléu
Quando finco meu chapeú
Bem debochado na nuca
Nem diabo, nem arapuca
Me cambeiam lá pro céu

Chega, chega, pega, pega
Que o zebu é caborteiro!
Me entrincheirei nas macegas
Atiçando os ovelheiros

E não é que o boi me veio
Causa do pala encarnado
Trazia um cusco agarrado
Bem na junta do garrão
Meu cachorro Tradição
Mordendo o tronco da oreia
Pressentindo a coisa feia
Virei o mango na mão

E aprumei o pitangueira
Bem no miolo do tirano
Nisso já vinha meu zaino
Me procurando no espaço
Coisas da lida de laço
Pra quem anda de à cavalo
Se eu não derrubo de um pealo
Derrubo a cusco e mangaço

Chega, chega, pega, pega
Que o zebu é caborteiro!
Me entrincheirei nas macegas
Atiçando os ovelheiros

Décima Dos Potreadores

Décima Dos Potreadores
(Eliezer Tadeu Dias de Sousa, César Oliveira)

Enquanto o mundo for mundo e um potro arrastar o toso
Se orquetá num cusquilhoso, será uma ginete constância
E na mangueira das estâncias ao formar a cavalhada
Haverá uma reservada prá que alguém prove o tranco
E há de estar um minga blanco prá topar essa bolada.

Filósofo de à cavalo, Saragoza, um cruzador
Esse platino condor que tempo adentro revoa
E a sua fama encordoa para amansar os anseios
Socando bocal e freios nas esperanças potreadas
No seu reino das estradas sobre o trono dos arreios.

Sid Vigil, potreador, por todo pago que ande
Ginete do meu Rio Grande, raiz de pátria e querência
Largando sua descendência sobre petiços d’em pêlo
É um gauchaço modelo, grudado em lombos de potros
E mesmo que surjam outros, servirá qual um sinuelo.

Dom Raul Beliciartu, irmão de pátria parceira
Que atravessou a fronteira trazendo potros por diante
Um ginetaço, um andante, amanuciando as distâncias
Domando léguas de ânsias, repassa sonhos bolidos
E galopeia os sentidos no varzedo das estâncias.

Almeida, melena branca, centauro nesta fronteira
No laço e na boleadeira traz maçarocas de crina
É um cacique na campina com lunarejos de allá
O rancho de lado de cá, a divisa, um fio de lombo
E as esporas que é um assombro nos costilhar do Aceguá

Jardim Silva e Alberdanha e outros que omiti
Me perdoem, porque aqui o tempo se pára escasso
Já na presilha do laço o verso é tropa, se afina
Já rebentou toda crina e falta força na perna
É a lei que nos governa, o que começa termina

Pra O Índio Que Gineteia

Pra O Índio Que Gineteia
(Rogério Villagrán, César Oliveira)

Quando me salta um floreio
De milonga pela boca
Me dá uma vontade louca
De “atorá” a guitarra ao meio
Sou um homem dos arreios
Conheço parada feia
Pois trago dentro das veias
Minha estampa palanqueada
E esta cantiga aporreada
Pra o índio que gineteia

Ginetear é uma vocação
Que o índio já trás de berço
Onde aprende a rezar o terço
Desta chucra religião
Pois quem trás no coração
Tropilhas de mal-costeados
Crinudos e descrinados
Maulas da marca borrada
São mestres das gineteadas
Entre potros e aporreados.

O mundo troca de ponta
E a vida toreia a morte
Porque o destino e a sorte
De gineteadas nos contam
De baguais que se desmontam
No meio da polvadeira
Treme o chão da fronteira
Quando um paysano se atora
Amarrando um par de esporas
Num par de botas “potreiras”.

Quem tem alma de palanque
Conhece a força do lombo
Mas não se entrega num tombo
Se algum corcóvo lhe arranque
Porque a volta do rebenque
Num floreio rasga o vento
A coragem é um sentimento
Que fez do taura um sulino
Esporeador dos malinos
Que sentem “cosca” do tento.

Pra o índio que gineteia
Este cantar é um regalo
Pois quando empeço a cantá-lo
O meu sangue corcoveia
Uma ânsia se boleia
“Inté” parece feitiço
Pois me agrada o reboliço
Que se apronta mano a mano
Co’as garras de algum paysano
Ou os ferros de um fronteiriço.