Mostrando postagens com marcador Mauro Ferreira. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Mauro Ferreira. Mostrar todas as postagens

Tango do Meretrício

Tango do Meretrício
(Mauro Ferreira, Luiz Bastos)

Rasguei a certidão de casamento
Finquei o braço na mulher
Foi um gritedo, vesti uma fatiota elegante
Despachei duas amantes e me mandei pro chinaredo

Não há lugar melhor que o meretrício
No vício é que eu encontro meu papel
Me enfrasco e canto um tango pras gurias
Que eu sou filho de uma tia da empregada do Gardel

Desde guri eu nunca fui um bom sujeito
Pois a falta de respeito sempre foi minha vocação
Me lendo a mão uma cigana disse tudo
Ou capam esse cuiúdo ou emprenha toda nação

Dizem que bom eu só vou ser depois de morto
Porque pau que nasce torto não dá mais prá endireitar
Eu sou teimoso e por não concordar com isso
Me mandei pro meretrício e fico até desentortar

Amanhã minha mulher que é uma cruzeira
Vai reunir a família inteira prá tentar me redimir
Mas eu garanto que enquanto tiver dinheiro
Nem que chamem os bombeiros não me tiram mais daqui


Peñarol

Peñarol
(Luiz Carlos Borges, Mauro Ferreira)

Quem é de Lavras se lembra do meu galgo Peñarol
Baio, brasino, bragado, olhos gateados de sol
Quando meu galgo arrancava com o lombo que era um anzol
Bicho que fizesse rastro saía do campo vasto
Pra os dente do Peñarol.

Me regalou Gim Pinheiro de lá de Tacuarembó
Era um filhote franzino, magrinho que dava dó
Quem ia dizer que aquilo fosse empurrar mocotó
Ganhar dezoito carreiras e os galgos desta fronteira
Entupiu os olhos de pó.

Lebrinha de pêlo fino, sorrito do pêlo grosso,
Depois de ele botar o olho não tinha muito retoco.
Cruzava dos outros galgos que nem dos cachorros "grosso",
Quadrava o corpo pra o lado, cortava de atravessado
E grudava atrás do pescoço.

Um dia o Cássio Bonotto, proseando e tomando um trago,
Me contou de um sorro baio que havia lá por Santiago,
Corria mais que os cachorros, vivia fazendo estrago,
De tanto comer cordeiro, já nem botavam carneiro
Nas ovelhas deste pago.

Eu disse pra este amigo: mês que vem vou na tua casa,
Me espera com uma de vinho e um chibo em cima da brasa.
O Peñarol vai na piola porque ele não perde vaza,
Te garanto que o tal sorro pra escapar do meu cachorro,
Só que entoque ou crie asa.

Cheguei no dia marcado, tinha gente até de farda,
Nunca vi tanto gaúcho, nunca vi tanta espingarda.
Diziam: o sorro é bruxo cruzado com onça parda.
Eu disse: deixem comigo! Quem tem medo do perigo
Que espere na retaguarda.

Quando batemos no rastro vi que o bicho era escolado,
Fez que ia pra coxilha e respingou rumo ao banhado,
Meteu o dente num galgo, depois cruzou no costado,
Com a cuscada na escolta, gambeteava e dava volta,
Parecia enfeitiçado.

Eu dei cancha pro meu galgo, que saiu erguendo pó,
Porque no fim do banhado era um capão de timbó.
Tinha que alcançar o maleva antes desse cafundó,
E eu também larguei com tudo, num lobuno topetudo
Que era marca da Itaó.

De fato o sorro corria como pouco sorro faz,
Mas peão só se governa onde não tem capataz.
Em seguida, meu cachorro fez ele virar pra trás,
E desceram sanga abaixo, "cosa" de macho com macho,
Trançando dente no más.

Foi quando eu ouvi um tiro vindo de lá do sangão,
Estouro de arma de chumbo de um louco sem precaução,
Apeei por cima do toso pra dar fé da situação,
Meu galgo tava sangrando, mas continuava peleando,
Baleado no coração.

Agarrou o sorro "das goélas" e apertou contra o capim,
Pra dar fim naquela lida, antes da vida ter fim.
Depois "periga" a verdade, mas juro que foi assim,
Deitou por cima do sorro, gruniu pedindo socorro
E morreu olhando pra mim.

Enterrei ele no campo florido de “Maria Mol”,
Se foi meu galgo bragado do lombo que era um anzol.
Lembro dele com tristeza quando sangra o pôr-do-sol.
O causo vem pra memória e a saudade conta a história
Do meu galgo Peñarol!




Peñarol - César Oliveira E Rogério Melo by Guascaletras

O Forasteiro



O Forasteiro
(Vinícius Brum, Mauro Ferreira, Luiz Carlos Borges)

Na sombra de um bolicho à beira estrada, daqueles que do mundo se perdeu
Encontra-se uma gente reunida, a espera de um chamado de seu Deus
Perfumes de bom fumo amarelido, paredes com suas almas penduradas
Paciências de um lugar envelhecido, e uma coragem de quem não tem nada

Apeia um forasteiro: O que é da vida?
Responde o bolicheiro: Está cansada,
A gente de bombacha anda esquecida, desiludida nos beirões da estrada
Buscamos nossa terra prometida um mundo pras crianças e pros velhos
O sul que nós sonhamos onde a vida devolva o que branqueou nossos cabelos
Mas cada ano a seca de janeiro, precede um novo inverno de asperezas
Parece que o destino do campeiro não pode pedir mais que pão na mesa

E aos poucos, o que diz o bolicheiro se multiplica em vozes pelo ar
E volta a se calar o forasteiro, junta o violão no peito pra cantar

Já vi quase de tudo em minha vida, há séculos que ando pela estrada
Vi a morte sobre a terra prometida, e a vida sobre a terra abandonada
Vi um homem pondo fogo na colheita, enquanto outro semeava num deserto
Já vi perto o que ontem era um sonho, e longe vi o que sempre fora certo
Um povo sonha Deus a sua imagem, e Deus devolve a terra a cada povo
Moldada no trabalho e na coragem que o povo usou pra levantar o sonho
Aqui é nosso inferno e paraíso, a vida é uma planta por cuidar
A que morrer por ela se preciso, o sul somente o sul pode salvar

Assim falou pro povo o forasteiro, depois montou e envolto num clarão
Sumiu emoldurado pela tarde, bem como o sol dissipa a serração
Uns dizem que mais altos que os cerros ele segue abençoando este rincão
Mas muitos acreditam que essa gente ouviu a voz do próprio coração
O certo é que um a um se foi às casas, por que havia uma planta por cuidar
Arar a terra a cada madrugada, para a semente que há de germinar
O homem faz seu Deus que faz o sonho, um sonho azul maior que este lugar
Na luz que vem dos olhos dessa gente, o sul um dia se iluminará

Pergaminho


Pergaminho
(Luiz Carlos Borges, Mauro Ferreira)

Quando boto o pé no estribo do meu zaino Pergaminho
Não tem chuva, não tem vento e não tem pedra no caminho
Busco a volta e tô a cavalo no meu zaino Pergaminho

Largo a galope de Lavras, Bagé fica bem pertinho
O casco bate na estrada, bate a franja no focinho,
O vento brinca na cola fazendo redemoinho
E o meu lenço bate asas sobre o pala azul-marinho,
Como uma garcinha branca voando num céu de linho
Quando largo de galope no meu zaino Pergaminho.

Quando boto o pé no estribo do meu zaino Pergaminho
Os amigos me acompanham mesmo que eu ande sozinho
E as lembranças dão de rédeas no meu zaino Pergaminho

Se me esporeia a saudade que é pior que ponta de espinho
Giro na pata e “avôo” como “avoa” um passarinho
Só paro no parapeito do rancho do meu vizinho
Onde a paisanita linda que costeia o meu carinho
Vem se aninhar no meu braço como uma pomba no ninho
Escarvando em frente ao rancho fica o zaino Pergaminho

Quando boto o pé no estribo do meu zaino Pergaminho
Brasil, Argentina e Chile vão no sangue cor de vinho
Correm séculos de história no meu zaino Pergaminho

Quando estou enforquilhado no cavalo Pergaminho
Zaino colorado estrela, pata branca até o machinho
Aparto boi na barbela, focinho contra focinho,
Se o boi não vai eu sujeito, se ele vai eu adivinho,
Quando salta tá apertado como abraço de padrinho,
Agarrado nos encontros do meu zaino pergaminho.

Quando boto o pé no estribo do meu zaino Pergaminho...

O Mouro E O Freio De Ouro

O Mouro E O Freio De Ouro
(Luiz Carlos Borges, Mauro Ferreira)

Um dia desses eu tava carneando um touro,
Fazendo um charque bem forte e lonqueando o couro
Quando anunciaram no rádio o Freio de Ouro
E eu fui no fundo do campo e volteei meu Mouro

Deixei posar de mangueira e tosei volteado
Ficou com pose de pingo de delegado
Então eu pensei comigo, bem entonado:
- Segunda-feira nós dois tamo consagrado!

Botei o freio com palmo e meio de perna
Senão o meu mouro enqueixa e se desgoverna
Tapeei meu chapéu na testa que eu sou da cosa
E entrei no parque com pose de Wilson Souza

De pronto vi a má vontade com o meu cuiudo
Porque tava meio magro e meio peludo
Ouvi quando um dos jurados falou em esquila,
E de vereda eu já tava no fim da fila...

Então eu disse pro mouro que nesse dia
Nós ia ter que mostrar tudo que sabia!
E enquanto os outros entravam de tranco e trote
Pra impressionar nós entramos a todo galope!

Mas veio a tal da figura amaldiçoada
Olhei pros feno e senti que ia dar cagada
Meu mouro loco de fome da adelgaçada
Parava em tudo que é fardo pra dar bocada...

O tal do giro nas patas eu não conhecia
Mas fiz na base do mango e da judiaria
E quando atirei o corpo pruma esbarrada
Partiu as canas da rédea e não vi mais nada!

Me ergui pra não fazer feio, numa tonteira,
Atei as rédeas, montei e fui pra mangueira
Me toca uma vaca preta, flor de ligeira
De vez em quando eu achava o rastro e a poeira...

Mas eu sou um índio campeiro e pedi socorro
E já saltaram pra dentro meus três cachorros,
Deixaram a tal polianga bem estaqueada
E eu quase parti no meio duma pechada!

Quando fomos paletear eu já tava em primeiro,
Corri com um tal de Coringa, mui traiçoeiro
O tipo fechou o novilho só por artista,
E o mouro parou nas tábuas do fim da pista!

Foi quando um jurado, um tal de Marcelo Coelho
Ameaçou levantar um cartão vermelho
E eu fui ver ele de perto e virei meu relho
Ele me deu um amarelo e largou o vermelho...

Voltei pra casa pensando que era verdade
El Freno de Oro no es changa, mire compadre!
Soltei o mouro nas égua e me fui pras tia,
Pois vi que meu mouro e eu damos só pra cria!!

Morocha

Morocha
(Mauro Ferreira, Roberto Ferreira)

Não vem Morocha, te floreando toda
Que eu sou manso e esparramo as garras
Nasci no inferno, me criei no mato
E só carrapato é que em mim se agarra.

Tu te aprochegas, rebolando os quarto
Trocando orelha, meu instinto rincha
E eu já me paro todo embodocado
Que nem matungo quando aperta a chincha.

Aprendi a domar amanunciando égua
E para as “mulher”, vale as mesma “regra”.
Animal, te para, sou lá do rincão!
Mulher pra mim é como redomão:
Maneador nas patas e pelego na cara...

Crinuda velha, não escolho o lado
Nos meus arreios, não há quem pelinche
Tu incha o lombo, te encaroço o laço
Boto os cachorros e por mim que abiche.

Não te boleia que o cabresto é forte
O palanque é grosso, senta e te arrepende!
Sou carinhoso mas incompreendido
É pra o teu bem, vê se tu me entendes