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Mostrando postagens com marcador Luiz Carlos Borges. Mostrar todas as postagens
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O Mouro E O Freio De Ouro

O Mouro E O Freio De Ouro
(Luiz Carlos Borges, Mauro Ferreira)

Um dia desses eu tava carneando um touro,
Fazendo um charque bem forte e lonqueando o couro
Quando anunciaram no rádio o Freio de Ouro
E eu fui no fundo do campo e volteei meu Mouro

Deixei posar de mangueira e tosei volteado
Ficou com pose de pingo de delegado
Então eu pensei comigo, bem entonado:
- Segunda-feira nós dois tamo consagrado!

Botei o freio com palmo e meio de perna
Senão o meu mouro enqueixa e se desgoverna
Tapeei meu chapéu na testa que eu sou da cosa
E entrei no parque com pose de Wilson Souza

De pronto vi a má vontade com o meu cuiudo
Porque tava meio magro e meio peludo
Ouvi quando um dos jurados falou em esquila,
E de vereda eu já tava no fim da fila...

Então eu disse pro mouro que nesse dia
Nós ia ter que mostrar tudo que sabia!
E enquanto os outros entravam de tranco e trote
Pra impressionar nós entramos a todo galope!

Mas veio a tal da figura amaldiçoada
Olhei pros feno e senti que ia dar cagada
Meu mouro loco de fome da adelgaçada
Parava em tudo que é fardo pra dar bocada...

O tal do giro nas patas eu não conhecia
Mas fiz na base do mango e da judiaria
E quando atirei o corpo pruma esbarrada
Partiu as canas da rédea e não vi mais nada!

Me ergui pra não fazer feio, numa tonteira,
Atei as rédeas, montei e fui pra mangueira
Me toca uma vaca preta, flor de ligeira
De vez em quando eu achava o rastro e a poeira...

Mas eu sou um índio campeiro e pedi socorro
E já saltaram pra dentro meus três cachorros,
Deixaram a tal polianga bem estaqueada
E eu quase parti no meio duma pechada!

Quando fomos paletear eu já tava em primeiro,
Corri com um tal de Coringa, mui traiçoeiro
O tipo fechou o novilho só por artista,
E o mouro parou nas tábuas do fim da pista!

Foi quando um jurado, um tal de Marcelo Coelho
Ameaçou levantar um cartão vermelho
E eu fui ver ele de perto e virei meu relho
Ele me deu um amarelo e largou o vermelho...

Voltei pra casa pensando que era verdade
El Freno de Oro no es changa, mire compadre!
Soltei o mouro nas égua e me fui pras tia,
Pois vi que meu mouro e eu damos só pra cria!!

Identidade

Identidade
(Luiz Carlos Borges)

Com chapéu de aba larga
E barbicacho de couro
E este lenço apresilhado
Por uma argola de ouro
Mais esta faixa bordada
Por descendente de Moro,
Eu me pilcho de pampiana,
Alpargata castelhana
E um patuá contra o agouro,
Defendendo o que é meu
Com esta voz que Deus me deu
Porque esse é meu tesouro.                
  
Cantando levo a vida
E a vida me levando,
Quem já nasceu cantando
Renasce todo dia.
Me encanta ser assim
Feliz, sem preconceito,
Um rio que do seu leito...                   
Derrama poesia!                                 

Qualquer espaço é lugar
Para soltar minha voz
Da nascente até a foz
O meu canto é assim:
- Mensageiro das barrancas,
Mescla de terra e capim,
Uma enchente de esperança
Que se agita e que se amansa,
Manancial que não tem fim,
Cristalina na vertente
Sou matriz e afluente
Desse rio que corre em mim.
                                
Cantando levo a vida
E a vida me levando,
Eu vou morrer cantando
E, se eu voltar um dia,
Permita Deus que eu volte
Gaúcha, deste jeito,
Com a mesma voz no peito...
Repleta de poesia 

Diálogo Antes Da Morte

Diálogo Antes Da Morte                                            
(Luiz Sérgio Metz, Luiz Carlos Borges)

Quem vem lá de trás da trincheira
Sou eu com minha bala certeira
Mas eu não tenho nenhuma arma
Perdi a que tinha de contra carga
Tem uma bala cortada em cruz
Quatro pedaços com quatro luz
Pra mim morrer não é tão fácil
Sou batizado, corpo fechado
Tenho no corpo uma cartilha
Escrita a sangue de farroupilha

Pra mim matar é coisa fácil
Tenho direito, to no combate
A tua morte mais essa cova
Serão as provas do desempate

Saio dali junto à trincheira
Quatro estandarte quatro bandeira
Cortada em cruz e junto à trincheira
Brilho brilhando no ar cortando

Bala de vento, bala de fogo
Bala de luz, bala de novo
Bala de novo, bala de luz
Bala de vento, bala de fogo

Mas vem o dia
Claro amarelo
Armando os homens
De bala e ferro

Armando os homens De bala e ferro
Se vem o dia
Claro amarelo

A Boa Vista Do Peão De Tropa

A Boa Vista Do Peão De Tropa
(Mauro Moraes)

Nos rincões da minha querência, arrabaleira conforme a vontade
Me serve um mate, pampa minha, nesta vidinha que me destes
Antes que embeste a novilhada, prá o mundo alheio das porteiras
Saúdo a poeira destas crinas, que me arrocinam sujeitando

E da garupa do cavalo, faço um regalo à ventania
Que na poesia destas léguas, tomo por rédeas e conselhos
Chamo no freio a coisa braba, o tempo é feio, mas que importa
Quando se engorda na invernada, não falta nada
Prá quem baba de focinho levantado e mais curioso

A fim de ir, a estância do passo, na direção de casa, costeando o arvoredo
O meu desespero porfia co'a tropa, fazendo o que gosta ao sul de mim mesmo
E todo o bem que havia maneado ao destino, divide caminho com a rês que amadrinha
O rio que eu não via, mimando de sede, a minha saudade

Na função dos meus afazeres, rememorados conforme a manada
Vou ressabiando afeito a fadiga, nas horas mingas de sossego
Talvez melhore durante a sesteada, sou por demais igual a campanha
Tamanha a alma de horizonte, ali defronte os cinamomos

Já não habita a teimosia, atropelando o meu rodeio
Quando me agüento no forcejo, pra erguer no laço os caídos
Não me lastimo, nem receio, vou pelo meio do sinuelo
Tocando manso os mais ariscos, só pelo vício de por quartos
Cuidar do gado, rondando o baio, que amanuceio

A fim de ir, a estância do passo, na direção de casa, costeando o arvoredo
O meu desespero porfia co'a tropa, fazendo o que gosta ao sul de mim mesmo
E todo o bem que havia maneado ao destino, divide caminho com a rês que amadrinha
O rio que eu não via, mimando de sede, a minha saudade





Léguas De Solidão

Léguas De Solidão
(Humberto Zanatta, Luiz Carlos Borges)

Em andanças por caminhos
Fez sua vida carreteando
O próprio destino de peão.
Cruzou sanga, cruzou mar,
Pedra e pó encurtando
Distâncias ganhou o pão

Traçando estradas
Nos atalhos primitivos
No horizonte do bem longe andejou
Como cobra
Se estendendo nas coxilhas
Novas querências o seu rastro demarcou

Transportou com segurança
Os mantimentos
Para o comércio dos bolichos
Nas estradas

Carreteou cargas de lã
De sal e charque
E a própria história
No ajoujo da boiada

Nas pousadas foi plantando
Vilarejos no ofício
Da campeira geografia
Pelo pago teve amores
Que marcaram qual o canto
Da carreta que rangia

Rasgou o pampa
Em léguas de solidão
E da carreta fez trincheira e fez morada
Fez da lua, do cachorro e dos avios
Companheiros incansáveis das jornadas

Do roda roda do tempo vão sumindo
A junta mansa e a carreta velho trastes
Porém a fibra do remoto carreteiro
Não há tempo ou pedregulho que desgaste

Romance Na Tafona

Romance Na Tafona
(Antonio Carlos Machado, Luiz Carlos Borges)

Maria florão de negra,
Pacácio negro na flor
Se negacearam por meses
Para uma noite de amor.

Na “tafona” abandonada
Que apodreceu arrodeando,
Pacácio serviu a cama
E esperou chimarreando
Do pelego fez colchão,
Do lombinho travesseiro,
Da badana fez lençol,
Fez estufa do braseiro.

A tarde morreu com chuva
Mais garoa que aguaceiro,
E incendiaram de amor
A “tafona” antes tapera.

A noite cuspiu um raio
Que correu pelo aramado
Queimando trama e palanque
Na hora desse noivado
E o braço forte do negro
Entre rude e delicado
Protegeu Negra Maria
Do susto desse mandado.

Tropa de Osso

Tropa de Osso
(Humberto Gabbi Zanatta)

De vez em quando no horizonte do passado
Surge uma nuvem de lembranças andarilhas
Vai repontando para dentro do meu peito
A minha infância com seus ossos em tropilha.

Tinha mangueira com banheiro bem cuidado
Tinha piquetes e um campo onde invernava
A minha tropa era de puro pedigree
Toda de ossos descarnados que campeava.

Gado de osso que foi parte do meu mundo
Carro de lomba e trator de corticeira
O meu bodoque e um banho no açude
Foram na infância minha vida verdadeira.

Tropa de osso quem não teve quando piá
Ou não foi piá ou não viveu como nós outros
Como era lindo a gurizada se entretendo
Com os ossitos que eram bois, ovelhas, potros.

Noutras andanças toco as reses dos meus sonhos
Por um estreito corredor feito esperança
Algumas vezes sou tropeiro, outras sou tropa
Mas sempre guardo os bois de osso na lembrança.

Redomona

Redomona
(Aparício Silva Rillo, Luiz Carlos Borges)

Redomona minha gaita querendona,
No abre e fecha no fole e que vem e vai,
Roncos de onça, assovios de ventanias,
Bater de remos nos remansos do Uruguai.

Redomona minha gaita quicentona,
Mesmo que a aba debochada de um chapéu,
De horizontes que se encolhem que se espicha,
Troõoes e brisas galopando pelo céu.

Duas fileiras, oito baixos por parceiros
Galos canteiros nos puleiros das manhãs
Chio de cambona num borralho pura brasa
Do galpão velho retomado a picumã

Minha parceira, companheira de surungo
China Maria, que amacia minhas penas
Riscando a alma no meu povo queixo duro
Num timbre macho de punhais de nazarena




Enviada por Luis Alessandro da Silva