Cadastre seu e-mail e receba as atualizações do Blog:

Mostrando postagens com marcador Gujo Teixeira. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Gujo Teixeira. Mostrar todas as postagens

De Lua Linda

De Lua Linda
(Gustavo Teixeira, Gujo Teixeira)

A lua cheia ponteou de novo no céu da pampa,
Desenhando estampa, imagem clara, poncho e chapéu,
Tranco largo, bom cavalo,
Quando o céu num pealo fez uma estrela vir de "buléo".
Luz cadente, noite afora,
E o meu par de esporas tem um brilho raro vindo do céu.

Faz contraponto com a prata inteira destas rosetas,
Clareando a silhueta que a luz da lua estendeu no pêlo.
Minha gateada, lume o ouro
Que prendeu no couro pra trazer o brilho assim de sinuelo,
E a lembrança é um açoite
Pra quem vê na noite uma flor amarela enfeitando o cabelo.

Toda distância se perde aos poucos rumando à estrada,
Léguas e a gateada, ao tranco, parece que voa,
Sabe o rumo, falta um eito,
Pois me aperta o peito uma lembrança dela que andava à toa.
"Fróxo" as rédeas e as ponte-suelas
Quebram lua e estrelas no espelho grande e fino da lagoa.

Quem tem retornos no rosto da amada junto à cancela,
E a lembrança dela numa saudade que é minha ainda,
Faz da estrada um verso assim,
Ela espera por mim com um aceno e um beijo de boas-vindas.
Flor morena, minha sina,
O teu riso é rima pra essa chacarera de lua linda.

A saudade aos poucos, dentro da noite, vai indo embora,
Largo da espora as duas estrelas quando a estrada finda,
Outro par de olhos negros
Me contam segredos desses que a noite nem sabe ainda...
A saudade é um mundéu,
Teu olhar é um céu pra essa chacarera de lua linda.

Como Se Morre Um Homem Valente

Como Se Morre Um Homem Valente
(Gujo Teixeira,Sabani Felipe de Souza)

Vai pelo tempo, nestas terras do Rio Grande
Um povo índio que se ergueu da própria fé
E um guerreiro que entre a paz se fez na guerra
E pela terra teve o nome de Sepé

Nas reduções, nas palavras dos jesuítas
Tinha o progresso desta terra missioneira
Mas sob as pedras e o olhar dos sete povos
Cruzaram as tropas de espanhóis e suas bandeiras

Então Sepé Tiaraju clamou ao céu
Contra os tratados assinados além-mar
E o povo índio guarani de São Miguel
Empunhou lanças de bravura pra lutar

E eram lanças e cavalos contra as armas
E eram valentes contra a força dos canhões
Mas pouco a pouco foram erguendo-se as cruzes
E foi tombando o povo e o sonho das missões

E um dia um índio no comando de sua tropa
Contra o que os céus lhe avisavam por perigo
Tombou na terra em que lutou porque era sua
Na dor da lança e da garrucha do inimigo

Talvez a força do lunar que tinha a fronte
Guiasse o rumo verdadeiro de sua terra
Talvez por isso que no lombo de um tordilho
Buscasse a paz, e mesmo assim achou a guerra

Sobre esta terra uma história foi escrita
Que não findou nos campos de Caiboaté
Vive em quem sabe que esta terra ainda tem dono
Alma gaúcha e missioneira de um Sepé

Vai na coragem de cair, se erguer de novo
Sangrar na luta, mas querer seguir em frente
Mostrar pro tempo e pra história deste pago
Como se vive e se morre um homem valente

E eram lanças e cavalos contra as armas
E eram valentes contra a força dos canhões
Mas pouco a pouco foram erguendo-se as cruzes
E foi tombando o povo e o sonho das missões

E um dia um índio no comando de sua tropa
Contra o que os céus lhe avisavam por perigo
Tombou na terra em que lutou porque era sua
Na dor da lança e da garrucha do inimigo

Meu Baio Em Quatro Elementos

Meu Baio Em Quatro Elementos
(Sabani Felipe de Souza, Gujo Teixeira)

A alma do meu cavalo
Tem vento pelas entranhas
Calma de brisa de maio
E entardecer de campanha
Tem nas noites de agosto
Uma inquietude que venta
E a mansidão pelas rédeas
Em contraponto a tormenta

Tem raios de temporal
Nas quatro patas calçadas
Que bate o rumo dos campos
Numa ciranda marcada
É a água mansa de sanga
Arroio de campo bueno
Planura de várzea larga
Molhada pelo sereno

Meu baio quando escarceia
Atira a sombra pra cima
E roda o coscós do freio
Abanando franja e crina
Clarão de lua no pelo
Coração de noite boa
Terra nos olhos de um tino
De nuvem negra e garoa
O sangue do meu cavalo
Tem fogo na sua essência
Mescla de tempo e coragem
E por de sol da querência
Meu baio tem casta antiga
Das estâncias da minha gente
Tem alma de gato e mancha
Nos elos do continente

É a água pra tanta sede
É terra por onde pisa
É o fogo que tem no sangue
É o vento que vira brisa
Pois quando estende a estrada
Num rumo de ir embora
Meu baio segue o brilho
Da luz da estrela da espora

Por isso quando encilho
Meu baio numa ramada
Firmo a história do pago
Na cincha bem apertada
É a descendência do campo
Na palavra que sustento
Alma, sangue, pelo e raça
Unindo quatro elementos.

A Pedra Da Boleadeira

A Pedra Da Boleadeira
(Gujo Teixeira, Mauro Moraes)

Era pedra, e seguiu pedra, era mato
E virou lenha, era tropa
E se foi embora num grito de venha venha

A pedra da boleadeira era do campo e da terra
Ganhou as asas do céu pra ser palavra de guerra
Quando era pedra redonda, moradora deste chão
De certo já derrubava por conta de um tropicão

Era pedra, e seguiu pedra, era mato
E virou lenha, era tropa
E se foi embora num grito de venha venha

Depois foi feita redonda, eterna em ciclos de lua
Paciência por precisão nas mãos de um índio charrua
Eram só pedras de campo, cansadas de andar à toa
Até que um dia alguém disse: Ah! Será que pedra não voa?

Era pedra, e seguiu pedra, era mato
E virou lenha, era tropa
E se foi embora num grito de venha venha

Ganhou parceiras pra guerra e tentos pra irem ao céu
Uma firme e duas soltas, rodando sobre o chapéu
Voava de rumo e vento fazendo um “zum” pelo rastro
Quando pegava era um tombo, quando cruzava era pasto

Era pedra, e seguiu pedra, era mato
E virou lenha, era tropa
E se foi embora num grito de venha venha

Pra bolear potros velhacos bem antes dos alambrados
A pedra da boleadeira tem ressábios do passado
Hoje em dia nem se enxerga Três Marias pelos céus
Se foi o tempo dos tombos, das potreadas e mundéus

Era pedra, e seguiu pedra, era mato
E virou lenha, era tropa
E se foi embora num grito de venha venha

Mas sei que ainda destino na pedra, na boleadeira
Que quando tem rumo certo é muito mais que certeira
Mas sei que hay um rumo certo na pedra, na boleadeira
Que quando tem rumo certo é muito mais que certeira

Era pedra, e seguiu pedra, era mato
E virou lenha, era tropa
E se foi embora num grito de venha venha

Quando Alguém Vem na Estrada

Quando Alguém Vem na Estrada
(Gujo Teixeira, Luiz Marenco)

Um quero-quero de alerta vigia a várzea do fundo
Rondando a paz no seu mundo de invernadas e planura    
Guerreiro por seu instinto feito tantos campo a fora
Que fazem puas das esporas estrelas pra noite escura
Estrelas pra noite escura

Meus cinamomos de galhos acenam pro mesmo lado
Do vento que faz costado pra os sonhos que a noite tem
Cuia e cambona recostam as cevaduras de um mate
Na hora que o cusco late talvez anunciando alguém

Vai na volta da minguante um sorriso anoitecido
Que há tempo andava esquecido nas noites aqui do posto
Luzindo as calmas do rancho dois olhos brilham ligeiro
Formando à luz do candeeiro a ilusão de um rosto
A ilusão de um rosto

Sempre nas noites do campo onde as almas andam inquietas
E a inspiração dos poetas vai muito além de um olhar
Surge nas sombras cansadas do fogo que ainda insiste
Uma lembrança que existe pelos cantos do lugar
Pelos cantos do lugar

Quem sabe guardar pra si silêncios de um fim de tarde
Tem quero-queros de alarde pra anunciação de quem vem
Desenhas sombras pra alma mesmo que a alma não queira
Pois sabe guardar inteiras as saudades que se tem

Por isso que volta e meia quando o silêncio se corta         
E um sonho bate na porta do meu rancho de morada
Cuido o cusco e o quero-quero nos seus alertas guerreiros
Que sempre chamam primeiro quando alguém vem na estrada
   Quando alguém vem na estrada

Milongão Pra Assobiar Desencilhando

Milongão Pra Assobiar Desencilhando
(Gujo Teixeira, Luiz Marenco)

Silhueta de um fim de tarde, prenunciando a mesma sombra
Do tarumã bem copado contra o lado do galpão
Que larga fumaça branca no mais alto se desenha
De certo é cambona e lenha na porfia do fogão

O gateado apura passo no acôo da cuscada
Que faz festa com o retorno dos campeiros na mangueira
Silêncio se vai aos poucos,  pelas esporas nas pedras
E os tinidos da barbela nos escarceios da oveira

Aos poucos, ouvem-se coplas num assobio compassado
Que entram galpão à dentro, depois voltam mais sonoras
Se vão tirando a carona, o xergão e entram mais calmas
Parecem que campo e alma se mesclam bem nessa hora

Água nos lombos suados e  mais águas pras cambonas
E o galpão se para quieto pra escutar um campeiro
Depois do dia de lida, de invernada e rodeio
Sobra tempo pra um floreio e um assobio milongueiro

Um mate recém cevado, silencia o galpão grande
Reverenciando quietudes nas sombras que aquerenciei
E quem refaz o seu dia de bem com a vida no campo
Um pelego sobre um banco é mais que um trono de rei
  
Ficou um resto de pasto agarradito no freio
Esporas mangos e laços e um silêncio esperando
Alguém de alma lavada a debruçar-se no violão
E tocar um milongão pra assobiar desencilhando
E tocar um milongão pra assobiar desencilhando

Romance De Flor E Luna

Romance De Flor E Luna
(Jairo Lambari Fernandes, Gujo Teixeira)

Quando um dia Rosaflor chegou no rancho
Pequeno mundo num fundão de corredor
Enxergou um pingo baio encilhado
E um gaúcho com um gateado no fiador
Mariano Luna domador seguia os ventos
Trazendo mansos pra cambiar pelas estradas
E Rosaflor filha mais moça do seu Nico
Lavava roupa junto às pedras da aguada
Rosaflor num riso manso e buenas noite
Entrou no rancho com seus olhos de querer
Mariano Luna com suas pilchas já puídas
Disse a moça um outro buenas sem dizer, sem dizer

Mariano Luna que tinha lua nos olhos
Entregou esse clarão aos olhos dela
E apagou a luz extrema que continha
Da outra lua que apontava na janela
A lavadeira pouco sabia das luas
E ainda menos dos olhares que elas têm
E descobriu então nos olhos do andante
Que de amores nem as flores sabem bem
Que de amores nem as flores sabem bem

O domador que só sabias desses campos
Sabia pouco do azul que vem das flores
Mas descobriu depois de léguas de estradas
Que há muito tempo não cuidava seus amores
De flor e luna se enfeitou o rancho tosco
Pequeno mundo num fundão de corredor
Que sem saber ficou mais claro e mais silente
Depois que lua debruçou-se sobre a flor
Ficou a estrada sem ninguém pra ir embora
E risos largos diferentes do normal
Um baio manso pastando pelo potreiro
E bombachas limpas pendurada no varal, no varal

Cansando O Cavalo

Cansando O Cavalo
(Gujo Teixeira, Luiz Marenco)

Por estas voltas de campo andei cansando o cavalo
Tocando o gado por diante mandando a vida pra frente
Sabendo que o sul pra gente é bem maior do que tantos
Tamanho os olhos dos outros querendo o verde dos campos

Andei rodando esporas sovando tantas badanas
Trazendo junto dos tentos minha querência em rodilha
Olhando a alma dos campos renascer junto as flechilhas
Mesmo que o verde mais lindo fique pra lá da coxilha

Por estas léguas manda cavalo
Mas vai tranqueando por diante
Que o mango vem de regalo

Mas ando sempre no tranco que minha prosa aguenta
Pois meu gateado sustenta as coisas quanto ele quer
Se tem o mundo por conta coiceia achirca e se some
Trocando a lida de ponta, perdendo a doma dos homens

Pra quem olhasse depois duas estampas pacholas
Levando o verde nos olhos e a querência a bate cola
Nem se daria por conta que o sustento vem da gente
E só bebe a melhor água quem descobrir a vertente

Por estas léguas manda cavalo
Mas vai tranqueando por diante
Que o mango vem de regalo

Só quando a lida me deixa descubro o mundo que eu vejo
Um pouco além da coxilha tão as coisas que eu desejo
Pra dizer bem a verdade são bem iguais as daqui
Mas sempre canso o cavalo só pra dizer que eu vi

Por estas léguas manda cavalo
Mas vai tranqueando por diante
Que o mango vem de regalo

Meu Peito Tem Um Rincão

Meu Peito Tem Um Rincão
(Gujo Teixeira , Luiz Marenco)

Meu peito tem um rincão
Que é de alma e de campo aberto
Tem um tarumã por perto
Sombreando a calma por onde vivo
É um horizonte largo
Pra qualquer vista que se estender
Pois aprendeu a renascer
Sempre que a vida lhe dá um motivo

Às vezes no fim do dia
Depois que o mate seca a cambona
A saudade redomona
Busca um achego nos sonhos meus
E eu olho tudo na volta
Pra me dar conta logo em seguida
Que tudo isto é a vida
Que há muito tempo peço pra Deus

Qualquer cruzada na estrada
Se avista ao longe rancho e galpão
E por certo um redomão
Pastando à tarde sem notar
E um bando de garças brancas
Planando a alma e sua essência
Este rincão é a querência
Pra quem  amigo desencilhar

Esse rincão tem fronteiras
Que nem eu mesmo sei onde vão
Tem um rancho-coração
Que guarda todo o meu sentimento
Às vezes desaba a quincha
Perdendo a força que a vida cobra
Igual ao capim que dobra
Sempre pro lado que sopra o vento

Depois das chuvas de outono
Verdeja sempre a mostrar o viço
Talvez bem seja por isso
Que a enchente leve por diante a sanga
Tem por dentro ensimesmado
Todas as mágoas e seus amores
E se nele nascem flores
Crescem  espinhos das japecangas

Esse lugar em que falo
É um campo largo pra quem se achega
Nem sei dizer se ele chega
A ser todo meu se a saudade aperta
Tem sempre alguém esperando
Com boas vindas e cuia na mão
Meu peito tem um rincão
E um coração com a porteira aberta!

Milongão De Madrugada

Milongão De Madrugada

(Gujo Teixeira, Joca Martins)

O galpão do meus arreios tem picumã na garganta
Por isso que logo cedo, pra madrugada ele canta...
Canta milongas de fogo, com lenha boa de aroeira
Na voz rouca das cambonas, alguma copla campeira.

O mate de erva nova recém clareia as janelas
E um galo preto abre o peito num moerão da cancela.
Parece que chama o sol que mete a cara em porfia
No horizonte acordando, com jeito de buenos dia!

Os pingos tudo na forma na volta do mangueirão
Esperam garras sovadas e rédea firme na mão
Pra depois n’algum aperto contra um brasino matreiro
Entenderem que na espora só anda pingo ligeiro.

Um baio marca de quatro por caborteiro relincha
É manso igual a espora que corta os fio da cincha.
E quando menos espera tranqueando de relancina
Agacha o toso pegando, pra tirá um cristão de cima.

Mas o campeiro que eu falo não é de quadro bonito
É daqueles que de foi feito, a tempo feio e a grito.
Dos que apartam campo a fora, a mango e bico de bota
E atropela em lançante, tirando boi dessas grota...

Por isso que o meu galpão tem vida nas madrugada
Fogo aceso, e uma milonga com as espora bem atada.
Pra o causo, nas precisão, entre um mate e mais outro
Precisar encilhar mais cedo e tirar as cóscas de um potro...

                                                          


A Estrela Torta Da Espora

A Estrela Torta Da Espora
(Gujo Teixeira, Everson Maré)

A estrela torta da espora, boca da noite desceu cadente
Metendo os dente, contra as costelas do colorado
Fechou o céu, escureceu, e eu firmei meu posto
A contragosto, que eu vinha lindo, de chapéu tapeado.

Quem que mandou, querer por conta desencilhar
Sem me deixar, nem apeiar, ou descer ligeiro
Foi resolver, mais outra vez, arrastar minhas garras
Agora por farra, vai me levar, que eu sou caborteiro.

Meu colorado as vez parece que esquece a doma
Quando se assoma com a alma ruim dos potro veiaco
Um dia desses, me errando coice, se estendeu pra fora
Me entortou a espora do pé direito e arrancou um taco.

Agora eu vinha, num tranco estradeiro de bota nova
Primeira sova, couro de capincho, cosa bem feita
E o colorado mudou o trancão, e agachou o toso
E por baldoso, me entortou de novo a espora direita.

Mais hoje a história, por bem ou mal, já foi diferente
Firmei os dente, uns sete ou oito, dos que restaram
Contra a barrigueira e couro grosso do colorado
E de chapéu tapeado, abanei o pala pros que olharam.

Mais aí que a sorte de quem se estriva, vai água abaixo
Foi-se o barbicacho, e o chapéu tapeado boleou pro chão...
E o colorado ainda pisa a copa do meu aba larga
Daí sim fiz carga, e entortei a outra, firmando o garrão.

Os Olhos Do Meu Cavalo

Os Olhos Do Meu Cavalo
(Gujo Teixeira, Cristian Camargo)

Aos poucos vão indo embora
As coisas que eu mais gostava...
Quando morreu meu cavalo
Por certo Deus descansava.

Era uma tarde de outubro
Com silêncio de sol-por
Um vento nas madressilvas
Ventava anúncios de dor.

No céu azul do potreiro
A corvada, em vôos rasos,
Trazia garras de morte
Mas a gente nem fez caso.

Quando a manhã veio cedo
Na recolhida pra encilha
Faltava um baio cebruno
Na forma da minha tropilha.

Um peão de olhos baixos
De freio e mango na mão
Me disse com dor na alma:
- Morreu seu baio, patrão!

As crinas entre as macegas
Cardavam teias de aranha
Que a manhã, ainda agora,
Tinha posto na campanha

E os olhos do meu cavalo
Que há pouco não viam nada
Já tinham ganhado o céu
Pelas garras da corvada!

Ficou um silêncio largo
Talvez faltando um relincho...
Só um choro pelo arame
Pelo cantar dos pelinchos.

Olhando o baio estendido
Pensei bem quieto comigo...
Isso não é coisa parceiro
Isso não é coisa parceiro
Que se faça com um amigo!

Coisa triste de se ver
Um amigo desse jeito...
Ontem mesmo lhe apertei
A cincha no osso do peito!

E hoje lhe vejo assim
Posto em partida, sem viço...
Se Deus bem sabe o que faz
Não tava sabendo disso!

As crinas entre as macegas
Cardavam teias de aranha
Que a manhã, ainda agora,
Tinha posto na campanha

E os olhos do meu cavalo
Que há pouco não viam nada
Já tinham ganhado o céu
Pelas garras da corvada!
Já tinham ganhado o céu
Os olhos do meu cavalo!

Se vai embora o meu baio
O pingo que eu mais gostava
Quando morreu meu cavalo
Quando morreu meu cavalo
Por certo Deus descansava

Cada Interior

Cada Interior
(Gujo Teixeira, Luiz Marenco)

Cada interior que há no olhar da minha gente
É um rincão de sombra mansa e de sereno
É o próprio pago com sentidos de crescer
Na mesma sina de quem sabe que é pequeno

É um rancho simples, e mais outro lado a lado
Barro de tempos nas paredes sem janelas
E um jeito seu, original em ser morada
Simplicidade e o que a vida deu pra ela

O arvoredo fica ao sul da encruzilhada
Rumando a estrada que se vai, sem nem notar
Que quem um dia ganha um rumo só de ida
Espera um tanto, pra na vida se encontrar

Mate cevado, prosa boa, até se encontra
Quando a tarde encarde o céu e a chuva desce
Água de longe, fogo escasso pras cambonas
É um, dois mates e depois já se agradece

Há uma esperança no florir das laranjeiras
De tempos doces, de esperar mesmo que em vão
Que a vida boa, um dia chegue e desencilhe
E ajeite um rancho igual a tantos no rincão

Não é pecado ser feliz com pouca coisa
Quando se quer apenas vida e um pouco mais
Pois pra quem vive um dia assim depois o outro
O tempo é escasso, pra querer voltar pra trás

O arvoredo fica ao sul da encruzilhada
Rumando a estrada que se vai, sem nem notar
Que quem um dia ganha um rumo só de ida
Espera um tanto, pra na vida se encontrar

Mate cevado, prosa boa, até se encontra
Quando a tarde encarde o céu e a chuva desce
Água de longe, fogo escasso pras cambonas
É um, dois mates e depois já se agradece

Da Boca Pra Fora

Da Boca Pra Fora
(Gujo Teixeira, Luiz Marenco)

Quando a palavra precisa
Da boca pra ganhar asas
Tem sempre um beijo guardado
Pra esconder o que ela traz.
Tem sempre um lindo sorriso
Que sabe estancar a dor
Porque a saudade faz parte
Da alma de um sonhador.

Cuidamos uma palavra
Pras horas que se precisa
Quando a voz tem sua vontade
E por si se realiza
E pode por mal falada
Ter suas garras afiadas
Deixando a vida marcada
Se o corte não cicatriza.

Tem vezes que a gente chora
Por coisas que nos habitam
Que ficam dentro da alma
Olhando a vida de longe.
Tem vezes que o sal dos olhos
Deixa a tristeza correr
Mas as lágrimas são minhas
E de quem as merecer.

Quando a palavra incomoda
Talvez por ficar tão presa
E se acostuma ao silêncio
Que volta e meia impera.
Os olhos voltam pra si,
O sorriso desencanta
Pela voz que a alma trouxe
E morreu junto à garganta.

Talvez por serem de tantos
E tantas vezes falada
A palavra traz a sina
De às vezes não dizer nada.
Mas quando menos se espera
Fala a sua vontade
Deixando dentro da boca
Um gosto ruim de saudade.

Tem vezes que a gente chora
Por coisas que nos habitam
Que ficam dentro da alma
Olhando a vida de longe.
Tem vezes que o sal dos olhos
Deixa a tristeza correr
Mas as lágrimas são minhas
E de quem as merecer.

Tem vezes que a gente chora
Mas da boca pra fora
Não fala nada.

Quando O Verso Vem Pras Casa

Quando O Verso Vem Pras Casa
(Gujo Teixeira, Luiz Marenco)

A calma do tarumã ganhou sombra mais copada
Pela várzea espichada com o sol da tarde caindo
Um pañuelo maragato se abriu no horizonte
Trazendo um novo reponte prá um fim de tarde bem lindo

Daí um verso de campo se chegou da campereada
No lombo de uma gateada frente aberta de respeito
Desencilhou na ramada já cansado das lonjuras
Mas estampando a figura campeira bem do seu jeito

Cevou um mate pura-folha jujado de maçanilha
E um ventito da coxilha trouxe coplas entre as asas
Prá querência galponeira onde o verso é mais caseiro
Templado à luz de candeeiro e um quarto gordo nas brasa

A mansidão da campanha traz saudade feito açoite
Com olhos negros de noite que ela mesma querenciou
E o verso que tinha sonhos prá rondar na madrugada
Deixou a cancela encostada e a tropa se desgarrou

E o verso sonhou ser várzea com sombra de tarumã
Ser um galo prás manhãs, um gateado prá encilha
Sonhou com os olhos da prenda vestidos de primavera
Adormecidos na espera do sol pontear na coxilha

Ficaram arreios suados e um silêncio de esporas
Um cerne com cor de aurora queimando em fogo de chão
Uma cuia e uma bomba recostada na cambona
E uma saudade redomona pelos cantos do galpão

Na Paz Do Galpão

Na Paz do Galpão
(Gujo Teixeira, Marcello Caminha)

A tarde cai, eu camboneio um mate
Junto ao braseiro do fogo de chão
O pai-de-fogo, puro cerne de branquilho
Queimando aos poucos na paz de um galpão

O mesmo inverno coloreando o poente
Final de lida, refazendo o dia
Lá no potreiro meu baio pastando
No cinamomo um barreiro em cantoria

Por certo a tarde em outros ranchos da campanha
Por serem humildes tenham a paz que tenho aqui
Pois só quem traz sua querência dentro d'alma
Sabe guardar toda esta paz dentro de si

Encosto a cuia junto ao pé do pai-de-fogo
Chia a cambona repontando o coração
Nas horas mansas que a guitarra faz ponteio
Numa milonga pra espantar a solidão

É lento o tempo na paz de um galpão
Ainda mais quando a saudade bate
A soledade vou matando aos poucos
Na parceria da guitarra e do mate

Então a noite se acomoda nos pelegos
Povoando os sonhos de ilusão e calma
Toda essa paz é um bichará pro inverno
Faz bem pro corpo e acalenta a alma

Por certo a tarde em outros ranchos da campanha
Por serem humildes tenham a paz que tenho aqui
Pois só quem traz sua querência dentro d'alma
Sabe guardar toda esta paz dentro de si

Encosto a cuia junto ao pé do pai-de-fogo
Chia a cambona repontando o coração
Nas horas mansas que a guitarra faz ponteio
Numa milonga pra espantar a solidão

Cova De Touro

Cova De Touro
( Luiz Marenco, Gujo Teixeira)

Quando os ventos de setembro aguçam o instinto das feras
E a novilhada retoça pelo cio da primavera
Covas de touro se abrem, florescem trevos no meio
E tauras travam combates pelo poder do rodeio

Um touro pampa de marca mandando terra pra cima
Outro touro pêlo osco por contragosto se arrima
Dois tauras por excelência, duas tormentas a frente
Juntando forças de campo pra desaguar numa enchente

Nos quatro esteios das patas eu monarqueava meu posto
Prenunciando pêlo e sangue que a espora conhece o gosto

"O mouro nem escarceava atento ao mundo da volta
E os meus quatro ovelheiros formavam a guarda da escolta
Depois da luta firmada e as armas postas pra guerra
Aspas de ponta de lança, lombos curtidos de terra"

Torenas assim se pecham como se fosse um ritual
Pelear pra sobreviver ou por um simples ideal

Não param nem pelo mango, nem nos encontros do mouro
Peleiam por serem tauras, por seu instinto de touro
Depois cansados tranqueiam e vão seguir seus caminhos
Deixando covas abertas prá um avestruz fazer ninho

Nos quatro esteios das patas eu monarqueava meu posto
Prenunciando pêlo e sangue que a espora conhece o gosto

Torenas assim se pecham como se fosse um ritual
Pelear pra sobreviver ou por um simples ideal

Alma de Espelho de Rio

Alma de Espelho de Rio
(Gujo Teixeira, Luiz Marenco)

Para quem se olha no espelho de um rio
Na volta pras casas num final de lida
Enxerga sua alma com olhos de espera
Além de uma imagem no rio refletida

A água não leva por mais que ela queira
Os sonhos tão simples que espelham-se ali
Mas leva pra sempre o que fora moço
Nas tantas enchentes que faz por aqui

Quebrou-se o espelho na sede do baio
Desfez-se a paisagem costeira do rio
Ficou refletida na água em remansos
Saudades disformes do que antes se viu

Descendo a corrente uma flor de aguapé
Prendeu-se na argola da rédea caída
Quem sabe até seja uma alma serena
Querendo apegar-se de novo na vida

Os olhos da gente se perdem na aguada
Tentando enxergar pra além do chapéu
No branco das nuvens um sonho distante
Das almas perdidas que vagam no céu

Apenas quem olha assim de olhos claros
Buscando a si mesmo no calmo da aguada
Verá com certeza além de uma imagem
Sua alma de campo no rio espelhada!

Cavalo Bom Vai Pro Céu

Cavalo Bom Vai Pro Céu
(Gujo Teixeira, Luiz Marenco)

"Ficou uma cruz cravada e um silêncio de arreio
Nem rangido, nem um coscorro da mordedura do freio
Ficaram estrivos juntos, xergão de carda, suado
E uma silhueta estendida, da dimensão do gateado"

Quem foi potro em primaveras, madrugando minhas encilhas
Já foi barco de alma leve, navegando essas coxilhas
Cascos de lua crescente, pra o céu grande das flexilhas
Há de encontrar invernada, rincão, querência ou potreiro
Lugar que o Deus dessa pampa, reserva pra os seus campeiros

Quem sabe o céu te espere, com garras de corvos negros
Ou intempéries de chuvas, trocando a dor por sossegos
Lavando um lombo sem viço, sem forquilha nem pelego
Quem já foi flor nos setembros, sendo Rio Grande na praça
Vai matar campo e flexilha, pra consumir sua carcaça

Quem soube morrer de velho, destino bom de cavalo
Numa várzea de sol posto, entrega-se qual regalo
Pras mãos certeiras do tempo, que nunca erra o pealo
Pois só quem teve um gateado, conhece as coisas que digo
Não mate ou venda um cavalo, que estás traindo um amigo

Quem foi terra sem cobrá-la, retorna agora pra ela
Querência da minha encilha, fechou pra sempre a cancela
Entregando os olhos pampas, pra uma estrela sentinela
Rogando a sombra da cruz, boto no peito o chapéu
Reverencio pra terra, cavalo bom vai pro céu

Enchendo Os Olhos De Campo

Enchendo Os Olhos De Campo
(Luiz Marenco, Gujo Teixeira, Valério Teixeira)

Manhãzita de maio e notícias do céu desabam nas casa
Um angico nas brasas, consome sem pressa seu cerno de lei
O meu cusco ovelheiro fareja o suor da xerga estendida
Que descansa da lida e do lombo do baio, meu trono de rei

Outro ronco de mate quebrava o murmúrio das chuvas nas telhas
E o baeta vermelha, aberto em suas asas pingava no chão
Imitando um sol posto, largava de pouco luz a da janela
E empurrando a cancela um ventito minuano assobiava no oitão

Pelo olhar da janela a vista perdia-se pelo campo vasto
Verdejando o pasto, coxilha e canhada até a beira do rio
Um mangueirão grande, guardando um silêncio dormido de pedras
E uma estrada de léguas são parte da estória de alguém que partiu

Partiram pra longe, feito tantos do campo, feito tantos dos meus
Que por conta de Deus e a procura de mais encilharam cavalos
E rumaram pra sempre, deixando o galpão, saudade e um mate
Pra depois n'outro embate, pelear por sonho e talvez encontrá-lo

Hoje abro a janela e pergunto pro tempo: por onde andarão?
Os que aqui no galpão, cevaram amargos por conta da lida
Que estenderam seus ponchos, baetas vermelhas de almas lavadas
Onde em léguas de estradas, na calma das tropas prosearam a vida

Só o silêncio das pedras e água da chuva que encharca a mangueira
E uma dor costumeira, saudosa do tempo, me fazem costado
Vejo o angico nas cinzas e o cusco ovelheiro, deitado num canto
E encho os olhos de campo de água e saudade, lembrando o passado
Manhãzita de maio, manhãzita de maio.