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Quando A Tropa Está Estourada

Quando A Tropa Está Estourada
(Ramiro Amorim, Erlon Péricles)

Mormaceira, tarde quente, no céu um corvo agourento ,
Campo quieto, nenhum vento, a tropa vinha abombando,
“Eu de cá” não achei graça quando se armou pro Sul,
Enegreceu o céu azul e a manga veio estourando.

Nisso o lote da ponta enveredou no aramado,
O seu Marcos assustado correu o facão nos fios,
Dois ficaram a cuidar da tropa no corredor...
“Eu de cá” fui de fiador, costeando a margem do rio.

Disse o Nelson, há bem pouco, ter visto formiga de asa,
Tacuru que abriu a casa sabendo que vinha água,
“Eu de cá” pensei que era uma chuva de verão,
Não uma tormenta osca de deitar as crinas no chão!

"Oito campeiro e três cusco" a repontar esses bois,
Bem certo eram vinte e dois, no total cento e quarenta,
Duas horas de tormenta, cachorro, estalo de relho,
Um boi pampa bem parelho caiu sangrando na venta.

Trovão, ventania e raio de enxergar o pago inteiro
A água pelos bueiros arrebentava os gargalos.
Lembro tudo o que falo, pois pouco adiantou a cuscada,
Quando a tropa está estourada precisa mesmo é cavalo.

Têm coisas que a gente pensa e mesmo com experiência
Pelas lidas da querência, patacoadas e atropelos ,
Perde o fio do novelo, fica a cismar onde errou,
O primeiro que desgarrou era manso e era sinuelo.

A chuva se foi num upa, o temporal ganhou mundo,
Olhares quietos, profundos, nos semblantes encharcados,
Alinhamos todo o gado e nenhum chego no rio,
Perdemos só o que caiu no lançante pro banhado.

Intérpretes: Ângelo Franco, Cristiano Quevedo


Raio Guacho

Raio Guacho
(Ramiro Amorim, Fábio Maciel, Índio Ribeiro)

Pelo novembro, como sempre, seu Toríbio
Firmava o pulso numa esquila de martelo...
Soltando o braço, parelho, “des” que maneava
Parando só pra o causo de estender um velo.

Num galpãozito, bem simples, de costaneira
Mermava a lida sem pedir a mão de alguém...
Costume antigo, de quem tem poucas ovelhas...
- Guardar uns pila nunca fez mal pra ninguém!

Sobre a mangueira, na frente do galpãozito,
Para as ovelhas, o umbu copava a sombra...
Eram quarenta, que minguavam uma a uma...
...e a meia tarde já ia com vinte e poucas!

E assim, solito, dava conta do serviço,
Por ter as manhas dessa gente do rincão...
Ia maneando, tosando e embolsando;
Curando talhos com reza e pó de carvão.

Por todo o dia – sem froxar – pulseou parelho,
- pra quem espera as horas são mais compridas –
Até que o tempo, se armou com nuvens e ventos
Fazendo o velho, parar pra cambiar a lida...

Trouxe as ovelhas da espera, pro galpãozito...
- Conforme um dia outro mestre lhe ensinou –
Puxou pra fora um couro cru, bem estaqueado
Beirando o umbu, frente o galpão se acomodou...

Ferro luzindo, tempo feio e copa alta,
Na mesma imagem, pareciam retratar...
O melhor pouso, chamando - sem dizer nada –
Pra um raio guacho, berrando, se acomodar...

No “dito e feito” – veio à ordem de um mandado
Clarão e estrondo de dimensão desparelha...
E ali por horas, ficou esculpida a cena
De um tosador curvado sobre uma ovelha!

- Quem facilita, perde a vida antes do tempo!
Foi um recado - lá de cima aqui pra baixo...
Pois quem diria: “O velho mestre dos martelos,
Partiu na lida e ainda por conta de um guacho!”


Intérprete: Vitor Amorim