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Milonga Borgeana


Milonga Borgeana
(Jaime Vaz Brasil, Pery Souza)

Dentro do livro de areia
A ampulheta do tempo
Virou do avesso.

Quase sangrando nos becos
A fome de um tigre
Em mim.

E farejei as palavras no ar
A mão do vento se abriu
E pôs em folha suspensa
A Milonga Borgeana.

Mil criaturas da noite
Transpassam inquietas
Os vidros de um bar.

Monstro Aqueronte passeia
Na ponta dos pés
Em nós.

Deu-me um espelho esquisito e falou
Da forma que a vida tem
De pôr no rosto uma cara
Que a alma desenha.

Milonga Borgeana
Milonga de sombra.

Um tigre de quatro cores
Perdeu-se em teu labirinto.

Milonga Borgeana
Espada de vento

Nas calles de Buenos Aires
Nas calles de mis entrañas.

El viejo tiempo se espraia
Circula a doutrina
E suspende o punhal.

No corredor
Os rangidos do piso
São tão iguais...

Gume afiado, o destino que fez
A mão do escuro fechar
E pôr em muro de sombra
A Milonga Borgeana.

Abre-se a fresta del sueño
E se adentra um mistério
Um segredo e o frio.

Entro com eles
No espanto da casa
Del Asterion.

Ah, quem me dera eu pudesse tocar
Um solo de bandoneón
Ao olho atento que mira
O futuro e o mundo...

Milonga de Sombras


Milonga de Sombras
(Jaime Vaz Brasil, Vitor Ramil)

As sombras que me rodeiam
Virão um dia cegar-me.
Seus vultos lentos e escuros
Incitam mudos alarmes.

O vidro das ampulhetas
Espelha as sombras que sinto
Na luz que aos poucos se afasta
Perdida em meus labirintos.

A mão que empunha o destino
E entre as sombras passeia
Derrama sobre meus olhos
Negros punhados de areia.

Um tigre manso e selvagem
Nas cores forja o oposto
Enquanto garras de sombra
Insere contra meu rosto.

A noite áspera e longa
Põe vendas em minhas vistas
E em suas sombras perenes
Me aflige e me conquista.

A mão que empunha o destino
Punhais de sombra me entrega;
E me reflito, impassível,
Em suas lâminas cegas.

Chimarrão

Chimarrão
(Vitor Ramil, João da Cunha Vargas)

Velho porongo crioulo te conheci no galpão
Trazendo meu chimarrão com cheirinho de fumaça
Bebida amarga da raça que adoça o meu coração.

Bomba de prata cravada junto ao açude do pago
Quanta china ou índio vago dá água ao seu pensamento
De alegria, sofrimento, de desengano ou afago.

Te vejo na lata de erva, toda coberta de poeira,
Na mão da china faceira ou derredor do fogão,
Debruçado num tição ou recostado à chaleira.

Me acotovelo no joelho, me sento sobre o garrão
Ao pé do fogo de chão vou repassando a memória
E não encontro na história quem te inventou, chimarrrão.

Foi índio do pelo duro quando pisou neste pago,
Louco pra tomar um trago, trazia seca a garganta,
Provando a folha da planta, foi quem te fez mate amargo.

Foste bebida selvagem e hoje és tradição,
E só tu, meu chimarrão, que o gaucho não despreza
Porque és o livro de reza que rezo junto ao fogão.

Embora frio ou lavado ou que teu topete desande
Minha alegria se expande ao ver-te assim, meu troféu,
Quem te inventou foi pro céu e te deixou pro Rio Grande.

Semeadura

Semeadura
(José Fogaça, Vitor Ramil)

Nós vamos prosseguir, companheiro
Medo não há
No rumo certo da estrada
Unidos vamos crescer e andar
Nós vamos repartir, companheiro
O campo e o mar
O pão da vida, meu braço, meu peito
Feito pra amar.

Americana Pátria, morena
Quiero tener
Guitarra y canto libre
En tu amanecer

No pampa, meu pala a voar
Esteira de vento e luar
Vento e luar.

Nós vamos semear, companheiro
No coração
Manhãs e frutos e sonhos
Pr'um dia acabar com esta escuridão
Nós vamos preparar, companheiro
Sem ilusão
Um novo tempo, em que a paz e a fartura
Brotem das mãos.

Minha guitarra, companheiro
Fala o idioma das águas, das pedras
Dos cárceres, do medo, do fogo, do sal
Minha guitarra
Tem os demônios da ternura e da tempestade

É como um cavalo
Que rasga o ventre da noite
Beija o relâmpago
E desafia os senhores da vida e da morte

Minha guitarra é minha terra, companheiro
É meu arado semeando na escuridão
Um tempo de claridade
Minha guitarra é meu povo, companheiro