A Meu Pai
(Afif Jorge Simões Filho, João de Almeida Neto)
Meu velho pai, com que desvelo outrora,
Me acalentaste o sonho de criança!
Eras a noite acalentando a aurora,
A saudade embalando uma esperança.
Parece que ouço ainda o teu preceito,
A tua voz pausada e emocional:
“Filho! Não fumes, que faz mal ao peito,
Não fumes filho, que o cigarro te faz mal”.
O teu filho cresceu, já faz poemas.
Sofre. E se chora o pranto rola em vão.
Vive dentro de um círculo de algemas,
Sem ter um gesto de libertação.
Continuo a pecar, meu pai. O mundo
Levou-me para o vício e para o nada.
Mas no fundo eu sou bom. Eu sou, no fundo,
Uma ingênua criança atrapalhada.
Tu és meu pai! A tua flama acesa
Palpita em mim, num milagroso brilho.
E eu sei que tenho um pouco de pureza,
Pela simples razão de ser teu filho.
Fiquei para sempre com esse olhar,
De guri desconsolado a olhar,
A olhar o terreno baldio,
De onde o circo partiu um dia antes.