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Mostrando postagens com marcador Luiz Bastos. Mostrar todas as postagens
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Tango do Meretrício

Tango do Meretrício
(Mauro Ferreira, Luiz Bastos)

Rasguei a certidão de casamento
Finquei o braço na mulher
Foi um gritedo, vesti uma fatiota elegante
Despachei duas amantes e me mandei pro chinaredo

Não há lugar melhor que o meretrício
No vício é que eu encontro meu papel
Me enfrasco e canto um tango pras gurias
Que eu sou filho de uma tia da empregada do Gardel

Desde guri eu nunca fui um bom sujeito
Pois a falta de respeito sempre foi minha vocação
Me lendo a mão uma cigana disse tudo
Ou capam esse cuiúdo ou emprenha toda nação

Dizem que bom eu só vou ser depois de morto
Porque pau que nasce torto não dá mais prá endireitar
Eu sou teimoso e por não concordar com isso
Me mandei pro meretrício e fico até desentortar

Amanhã minha mulher que é uma cruzeira
Vai reunir a família inteira prá tentar me redimir
Mas eu garanto que enquanto tiver dinheiro
Nem que chamem os bombeiros não me tiram mais daqui


Tia Corrucha

Tia Corrucha
(Antonio Carlos Machado, Luiz Bastos)

Pele preta, carapinha já tordilha
Traz na veia o sangue forte da gaúcha
Ana Terra destes tempos, vai passando
Mãe de muitos, vó de tantos...Tia Corrucha

Sua mão de palma branca e dorso negro
Cabecinha de criança enterneceu
Em seu colo doce e quente se aninhavam
Filhos brancos doutros ventres, não do seu

Quando moça gerou filhos, correu mundo
E varou de ponta a ponta estes rincões
Quitandeou, arrumou festas para os outros
Passou a vida conquistando corações

Aos oitenta, o anjo negro é como o cerne
É a velha timbaúva que não tomba
Tia Corrucha bate forte suas chinelas
E tem a alma limpa e pura como a pomba


Rumos Perdidos

Rumos Perdidos
(Vinícius Pitágoras Gomes, Luiz Bastos)

Gaúchos farrapos de barbas tostadas
Cavalgam corcéis de pelo carvão
Farejam no tempo os rumos perdidos
Galopam silêncios sem patas no chão

Rebanhos imóveis, estátuas de sal
Ruminam as cinzas no campo queimado
E os peixes que saltam das sangas de óleo
Beliscam as iscas na pá de um arado
E os peixes que saltam das sangas de óleo
Beliscam as iscas na pá de um arado

Cuidado com a terra que a volta virá
Semeando desertos, ninguém colherá
Cuidado com a terra que a volta virá
Semeando desertos, ninguém colherá
Cuidado com a terra que a volta virá

Sutis aguapés nas velhas lagoas
Sepultam raízes em negro veneno
E as garças esguias de asas cansadas
Já não podem voar seu vôo sereno

Pupilas exaustas das rondas insones
Procuram na estrela as fontes da vida
E a mão que semeou a terra exaurida
Espera a semente que não germinou
E a mão que semeou a terra exaurida
Espera a semente que não germinou

Cuidado com a terra que a volta virá
Semeando desertos, ninguém colherá
Cuidado com a terra que a volta virá


Negro Bonifácio


Negro Bonifácio
(Luiz Bastos, Antônio Augusto Ferreira, Mauro Ferreira)

Mataram o Bonifácio num comércio de carreira
Caiu o negro peleando para que a morte sotreta
Se espoje na carne preta, sem perguntar: até quando?
Caiu o negro peleando.

Era tão linda Tudinha,
De enfeitiçar qualquer um.
E aquele negro muçum,
Que encanto será que tinha?

Como entender seu achego?
Tinha nas mãos o Nadico!
Tanto moço branco e rico,
E aquele caso com um negro!

Em casos de valentia,
Há sempre um negro no flanco.
Bonifácio fosse branco
Nem história se teria.

Caiu o negro peleando para que a morte sotreta
Se espoje na carne preta, sem perguntar: até quando?

Bonifácio teus direitos permanecem obscuros
Enredados nos impuros caminhos dos preconceitos.

Campo Santo

Campo Santo
(Mauro Ferreira, Luiz Bastos)

Não, não digas nada
Que o silêncio é muito
Respeite a ausência de quem foi embora
Os caminhos no mundo de quem chora
Não tiveram o rumo que elegeram
Este é o lugar dos que adormeceram
Para uma noite imensa e sem aurora

São vazias as frases de consolo
A tristeza que aqui abre-se em véu
Faz baixarem-se as abas do chapéu
Para banhar um olhar de estrelas rasas
Esse é o lugar dos que bateram asas
Contaram nuvens e fizeram céu

Junto ao corpo sepulta-se a ilusão
Das sementes plantadas sobre as cruzes
Só tristezas e saudades brotarão
A terra que criou também desfaz
Na cruz cravada sob a dor dos vivos
O tempo que passou não volta atrás

Por isso visto negro e olho triste
Carregado das mágoas que confesso
Só o silêncio e mais nada é o que te peço
A morte ao levar uns maltrata os outros
Esse é o lugar dos que encilharam potros
E alçaram uma viagem sem regresso

Não, não digas nada
Que o silêncio é muito

Aguas De Dentro

Águas De Dentro
(José Fernando Gonzales, Talo Pereyra, Luiz Bastos)

Os rios que carrego
Tem águas vermelhas
Mais rubras que as águas
No alto Uruguai

São águas paridas
Na fonte da vida
Vertentes perdidas
Na história dos pais

Nas águas de dentro
No rio das funduras
Navegam sementes
Plantadas em nós

São águas maduras
As águas vermelhas
Os veios antigos
Que vem dos avós

As águas de dentro
São águas de mim
Farão corredeira
Além do meu tempo
Depois do meu fim

As águas de herança
Dos rios que carrego
Vermelhas da ânsia
De antigos caudais

Tem força de braço
No corte do relho
E remanso sereno
Na luz de ancestrais

Os rios que carrego
Farão descendência
Somando as memórias
Trazidas de mim

E as águas de dentro
Serão corredeiras
Nas veias dos filhos
Depois do meu fim

Cambichos

Cambichos
(Luiz Bastos, Jorge Rodrigues de Freitas)

Quando escaramuça no meu peito uma saudade
Agarro as garras pra encilhar meu estradeiro
E enquanto a tarde já se apaga pelos cerros
Minh'alma acende suas paixões e seus segredos

Depois a noite trás a lua leve e calma
Estes banhados erguem vozes e cochichos
Eu abro as asas onduladas do meu pala
Porque me bate a sede louca dos cambichos

Tiranas lindas que me arrastam pra um surungo
Num fim de mundo onde geme uma cordeona
Onde se embala minha alma de campeiro
Pelos luzeiros das miradas querendonas

Gringas mestiças e morenas cor de aurora
Negras e claras se confundem na fumaça
Meu coração é um barco errante nessas horas
Passando a noite sem saber que a noite passa

Mas quando o sol braseia as barras do horizontes
Só restam rumos e recuerdos pra seguir
Porém mais vale pra um gaudério esta saudade
Do que não ter saudade alguma pra sentir.



Enviada por Liane